terça-feira, 9 de julho de 2013

A tal da culpa (é minha)




Mãe e culpada são sinônimos. Não deveria ser, mas é. Joguem no gugol “culpa” e certeza que vai cair em milhares de blogs e páginas sobre maternidade. Esse meu texto será mais um.
Não vou entrar no mérito da polêmica sobre isso, mas o fato é que mãe e culpa é como "Amor sem beijinho, bochecha sem Claudinho", formam uma dupla perfeita?!
Até criaram uma campanha campanha no facebook pra isso. 

Ok, ela tem o viés totalmente de incentivo ao consumismo como disse Lu Brasil, aqui, que tem a lógica mais ou menos assim: 

“Diga não à culpa pelo desmame, pra quê amamentar até os dois anos?” (e olha que linda essa nova mamadeira NUK)
“Diga não à culpa por ter leite fraco” (ja viu nossa linha de leite NAN?)
“Diga não à culpa por estar sempre ocupada afinal filhos são incansáveis no quesito pedir atenção ( Saiu a nova cadeirinha que embala o bebê e a pilha dura até ele fazer 3 anos)
“Diga não á culpa por trabalhar tanto, qual o problema de ser uma mãe (cansadíssima, estressada e desinteressada) de fim de semana? (e trabalhe muito pra garantir a compra de todos os itens anteriores) (BRASIL. Lu)

Mas quero focar no slogam da campanha: “Culpa, não!” (Até curti a campanha no face, porque achei legal, sem ler o teor #soudessas)

Sabe, desde que comecei a ler sobre maternidade (e isso foi bem antes de ser mãe, quando comecei a faculdade, atendendo famílias nos meus estágios, culminando no meu trabalho de conclusão de curso sobre a de invisibilização das mães biológicas no processo de adoção) desmistifiquei um pouco tudo que a cerca. O amor incondicional, o instinto materno, a vocação “natural” que toda mulher carrega e também a culpa. 

Quase tudo que falei é cultural e a MINHA maternidade é diariamente construída. Não é cor de rosa. Não é fácil. Não tava no meu útero o que determinou ser a mãe que sou hoje. Eu sou a mãe que escolho ser. E eu escolhi abrir mão de ser culpada.

Essa tal culpa da maternidade está diretamente ligada ao machismo, que prega  que chamamos de dupla e/ou tripla jornada. É a tal da síndrome da Mulher Maravilha, que faz as mulheres (leigas) culparem o feminismo por ter que dar conta de tudo. E só pra ficar claro: nós não temos, não.

Explicando: hoje, a mulher trabalha fora, chefia empresas e equipes, mas também casa e têm filhos e se vê, muitas vezes perdida entres esses papéis. Como se tivesse que ser bem-sucedida e realizada em ambos. Talvez a culpa materna não existisse (ou fosse menos opressora) nos tempos das nossas avós, quando elas se dedicavam integralmente ao lar e à educação dos filhos. . Não tinha culpa, mas talvez houvesse desejo reprimido. Não tinha culpa, mas também talvez não tivesse felicidade. Não tinha culpa, mas também não tinha direito de escolha, portanto não vêm ao caso

Hoje, ainda são poucas as mulheres que tem coragem de assumir que não querem ser mães e mesmo assim, são vista com maus olhos pela sociedade. E às que escolhem ser mães, mas não querem abrir mão de suas carreiras, sua vida pessoal, seus relacionamentos? Para essas, só resta um veredicto: a culpa.
 
O que mais escuto das pessoas quando falo que Miguel fica o dia todo na escola (pra eu trabalhar hein?) é: “tadinho”.
Oi?
Tadinho porque? 

Se eu viajo à trabalho é “tadinho”. Quando descobrem que me divorciei do pai dele: “tadinho”. Se ele vai ficar com o pai e a família paterna, a cada quinze dias: “tadinho”. Se ele fica com a avó ou com alguém pra mãe (tadinha) sair uma vez na vida é “tadinho”.

Mesmo hoje, as pessoas esperam que uma mulher abdique de toda uma vida pra ser mãe, pra viver a maternidade. E essa mulher, como eu, não se sente culpada, aí meu amigo é o fim da picada.

Vejam bem, não estou dizendo que ter um filho ou filha seja fácil, que a vida não mude, que não tenhamos que abdicar de muitas coisas. Tudo isso é verdade. Mas quando esperam que essa doação seja só por parte das mães é que me indigna. 

Sim, a “mãe natureza” (tá vendo como a culpa é sempre da mãe?) concedeu a nós o dever de carregar por 9 meses, parir, amamentar, mas carregar um fardo e título de “CULPADA” eu dispenso.

 Luto por uma paternidade compartilhada (e não, trocar fralda não torna um pai ativo e participativo), isso no que diz respeito aos sentimentos também.

Tento passar ao Miguel que o pai dele é tão importante quanto eu. Lá em casa, não tem essa de “mãe é mãe”. Mãe é mãe e pai é pai. Eu erro, ele erra. Queremos o melhor, acertamos também. Não tem essa de mãe mais carinhosa. Não tem essa de mãe educa, pai estraga. Não tem essa de homem é tudo igual. Não tem essa. Não tem essa.

No meu caso especificamente, não consegui chegar numa guarda compartilhada matematicamente equilibrada. Quem fica com o “grosso” da coisa ainda sou eu, mas tá melhorando. Quando preciso viajar a trabalho (ou mesmo a lazer/descanso) é com o pai que Miguel fica. E super bem, falando comigo ao telefone e pedindo presentes. O pai dele viaja a trabalho também. 

Desde cedo Miguel sabe que a mãe dele também trabalha fora, tem uma carreira. Se busco ele mais tarde na escola, no plantão, explico que estava em um reunião importante e etc. É lógico que não faço isso todo dia. Tento ser o mais presente possível, dou carinho, amor, atenção e o principal: falo a verdade pra ele, sempre. 

Com isso vivo uma maternidade sem culpa e assim, sou uma mãe melhor.

O que a Lu Brasil disse no texto, eu discordo um pouco: do papel que a culpa tem de nos fazer melhor. Aliás, nos fazer melhorar ela até pode fazer, mas nos motivar e viver dela é que não dá.

Segundo o dicionário (da internet aí): 

Responsabilidade de um ato ou uma omissão de um crime.
Causa de um mal.
Delito, falta.”

Essa culpa ruim, estrutural e estruturante que falei no texto, é uma coisa. É aquilo da mulher ser a melhor profissional, a melhor mãe que pode ser e ainda assim se sentir culpada no fim do dia porque não fez tudo, não deu conta de tudo.

 É o que mais acontece.

A outra e saudável culpa é aquela pontual. De você gritar excessivamente com seu filho sem necessidade ou de não ter lido a historinha porque preferiu ver a novela. Essa, eu sinto. De vez em quando e porque sou humana, erro. Sinto remorso. Peço desculpas (sim, eu peço desculpas ao Miguel, porque mostro pra ele que mãe também erra), tento reparar. 

Essa culpa pode acontecer com mãe, pai, avó, tio, e vizinho. Não é exclusiva da mulher, nem deve afetar sua autoestima e maternidade.

Eu ainda vou além disso. Sou tão segura quanto ao meu “eu mãe” que a outra culpa não me consome, nem me atinge, mesmo quando vem de fora. E parando pra pensar, cheguei à conclusão de que sou culpada mesmo. A “culpa boa”.

Vejam bem, outro dia vi a Lívia  falando no facebook: 

“As pessoas dizem que DOU sorte de ter filhos bonzinhos, Não dou sorte, dou EDUCAÇÃO”. 

É isso, me senti contemplada. Ouço o dia todo que Miguel é uma criança muito inteligente, muito comunicativa, educada, amável, carinhosa, etc, etc e que tenho sorte. Em contrapartida, se ele tem uma febre a culpa é minha. Uma lógica que não entra na minha cabeça.

Quem tá com ele todo dia? Que veste uniforme (alias, o ensinou a se vestir sozinho)? Que prepara café da manhã? Que leva pra escola de ônibus (ensinando que nosso carro foi roubado, mas que não tem problema, ônibus é legal também)? Que ensina a passar na faixa de pedestre, dando sinal com a mão? Que ensina que não pode jogar lixo na rua? Que tem que respeitar os mais velhos? Que tem que falar com licença, obrigado, por favor e bom dia? Que ensina a agradecer à Deus pelas coisas? Que ensinar a guardar os brinquedos? Que não precisa bater pra ensinar? Que quando bateu pediu desculpas e ensinou que violência não educa? Que nunca deixou chorando? Que ensina que pra birra não resolve nada? Que dorme junto? Que abraça, beija e dá muito carinho? Que amamentou por dois anos? Que trata ele com respeito? Que ensina a respeitar os mais velhos? Quem dá banho e ensina que não pode desperdiçar água? Quem lê história e contextualiza? Quem incentiva a ler? Quem tá lá todo dia, faça chuva ou faça sol, doente ou saudável, de carro ou a pé pra buscar na escola e viver tudo isso, diariamente?

EU, EU, EU.

Então, minha gente, sem desmerecer Deus que meu deu um filho MEGA especial, eu assumo: SOU CULPADA.

Meu filho é doce, inteligente, formula frases inteligentes, é elogiado na escola, compartilha brinquedos, respeita os mais velhos, tem uma sensibilidade e inteligência acima da média, sabe sobre leis de trânsito e direitos humanos, canta, dança, é feliz e amável por pura CULPA MINHA.
É isso. Sou culpada mesmo. Agora sim.

Observação: não quis nesse post desconsiderar a importância do pai da criança, dos avós e tios, além da escola, que são de fundamental importância do desenvolvimento. É só um desabafo com um pouco de auto-marketing.

4 comentários:

  1. Musa! poderia receber o titulo de representante das mães de verdade... que não vive no mundo com de rosa.... podemos e somos felizes com nossos pequenos mas o mundo continua girando.
    luciana

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  2. Ei Marília.. esse texto diz muito para mim... Não consigo me livrar da culpa.. da "necessidade" de dar conta de tudo e da culpa de ver que não dou conta nem da metade.
    Tento muito a guarda compartilhada... pq mesmo sendo casada, o que mais existe é a "guarda" só da mãe, a responsabilidade só da mãe, a mãe que é a O cara, que sabe que faz... e bla, bla, bla.... Mas eu brigo muito pelas responsabilidade dividida... e acho que essa briga vai longe!!!
    Seu texto me diz muito, eu poderia ter escrito (se escrevesse tão bem quanto vc) pq luto muito pela educação de Laís, para ela ser uma criança "boazinha por sorte".. e tbm ouço muito o "tadinha" por ela estar na creche o dia todo. mas ainda não consegui me livrar da culpa... é um processo!!!
    Parabéns pelo texto... e pelo filho bonzinho que Deus lhe deu!!! hehehe
    Bj grande!

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  3. Aah! Que eu amei seu texto!!
    É bem isso... a culpa boa. Nossos filhos são o espelho do que passamos pra eles. Nada mais que isso! Se ensinamos e passamos coisas boas, vamos levar essa culpa boa com o peito cheio de orgulho!!! ♥

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  4. Lila, amo a forma como você se expressa!!
    Parabéns!

    Bjos

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