Mãe
e culpada são sinônimos. Não deveria ser, mas é. Joguem no gugol “culpa” e
certeza que vai cair em milhares de blogs e páginas sobre maternidade. Esse meu
texto será mais um.
Não
vou entrar no mérito da polêmica sobre isso, mas o fato é que mãe e culpa é como "Amor sem beijinho, bochecha sem Claudinho", formam uma dupla perfeita?!
Até criaram uma campanha campanha
no facebook pra isso.
Ok, ela tem o viés totalmente de incentivo ao consumismo
como disse Lu Brasil, aqui, que tem a lógica mais
ou menos assim:
“Diga
não à culpa pelo desmame, pra quê amamentar até os dois anos?” (e olha que
linda essa nova mamadeira NUK)
“Diga
não à culpa por ter leite fraco” (ja viu nossa linha de leite NAN?)
“Diga
não à culpa por estar sempre ocupada afinal filhos são incansáveis no quesito
pedir atenção ( Saiu a nova cadeirinha que embala o bebê e a pilha dura até ele
fazer 3 anos)
“Diga
não á culpa por trabalhar tanto, qual o problema de ser uma mãe (cansadíssima,
estressada e desinteressada) de fim de semana? (e trabalhe muito pra garantir a
compra de todos os itens anteriores) (BRASIL. Lu)
Mas
quero focar no slogam da campanha: “Culpa, não!” (Até curti a campanha no face,
porque achei legal, sem ler o teor #soudessas)
Sabe,
desde que comecei a ler sobre maternidade (e isso foi bem antes de ser mãe,
quando comecei a faculdade, atendendo famílias nos meus estágios, culminando no
meu trabalho de conclusão de curso sobre a de invisibilização das mães biológicas
no processo de adoção) desmistifiquei um pouco tudo que a cerca. O amor
incondicional, o instinto materno, a vocação “natural” que toda mulher carrega
e também a culpa.
Quase tudo que falei é cultural e a MINHA maternidade é
diariamente construída. Não é cor de rosa. Não é fácil. Não tava no meu útero o
que determinou ser a mãe que sou hoje. Eu sou a mãe que escolho ser. E eu
escolhi abrir mão de ser culpada.
Essa
tal culpa da maternidade está diretamente ligada ao machismo, que prega que chamamos de dupla e/ou tripla jornada. É a tal da síndrome da Mulher Maravilha, que faz as mulheres (leigas) culparem o feminismo por ter que dar conta de tudo. E só pra ficar claro: nós não temos, não.
Explicando: hoje,
a mulher trabalha fora, chefia empresas e equipes, mas também casa e têm filhos
e se vê, muitas vezes perdida entres esses papéis. Como se tivesse que ser
bem-sucedida e realizada em ambos. Talvez a culpa materna não existisse (ou
fosse menos opressora) nos tempos das nossas avós, quando elas se dedicavam
integralmente ao lar e à educação dos filhos. . Não tinha culpa, mas talvez houvesse desejo reprimido. Não tinha culpa, mas também talvez não tivesse felicidade. Não tinha culpa, mas também não
tinha direito de escolha, portanto não vêm ao caso
Hoje,
ainda são poucas as mulheres que tem coragem de assumir que não querem ser mães
e mesmo assim, são vista com maus olhos pela sociedade. E às que escolhem ser mães, mas não querem abrir mão de suas carreiras, sua
vida pessoal, seus relacionamentos? Para essas, só resta um veredicto: a culpa.
O
que mais escuto das pessoas quando falo que Miguel fica o dia todo na escola (pra eu trabalhar hein?) é: “tadinho”.
Oi?
Tadinho
porque?
Se
eu viajo à trabalho é “tadinho”. Quando descobrem que me divorciei do pai dele:
“tadinho”. Se ele vai ficar com o pai e a família paterna, a cada quinze dias:
“tadinho”. Se ele fica com a avó ou com alguém pra mãe (tadinha) sair uma vez
na vida é “tadinho”.
Mesmo
hoje, as pessoas esperam que uma mulher abdique de toda uma vida pra ser mãe,
pra viver a maternidade. E essa mulher, como eu, não se sente culpada, aí meu
amigo é o fim da picada.
Vejam
bem, não estou dizendo que ter um filho ou filha seja fácil, que a vida não
mude, que não tenhamos que abdicar de muitas coisas. Tudo isso é verdade. Mas
quando esperam que essa doação seja só por parte das mães é que me indigna.
Sim, a “mãe natureza” (tá vendo como a culpa é sempre da mãe?) concedeu a nós o dever de carregar por 9 meses, parir,
amamentar, mas carregar um fardo e título de “CULPADA” eu dispenso.
Luto por
uma paternidade compartilhada (e não, trocar fralda não torna um pai ativo e
participativo), isso no que diz respeito aos sentimentos também.
Tento
passar ao Miguel que o pai dele é tão importante quanto eu. Lá em casa, não tem
essa de “mãe é mãe”. Mãe é mãe e pai é pai. Eu erro, ele erra. Queremos o
melhor, acertamos também. Não tem essa de mãe mais carinhosa. Não tem essa de
mãe educa, pai estraga. Não tem essa de homem é tudo igual. Não tem essa. Não
tem essa.
No
meu caso especificamente, não consegui chegar numa guarda compartilhada
matematicamente equilibrada. Quem fica com o “grosso” da coisa ainda sou eu,
mas tá melhorando. Quando preciso viajar a trabalho (ou mesmo a lazer/descanso)
é com o pai que Miguel fica. E super bem, falando comigo ao telefone e pedindo
presentes. O pai dele viaja a trabalho também.
Desde cedo Miguel sabe que a mãe
dele também trabalha fora, tem uma carreira. Se busco ele mais tarde na escola,
no plantão, explico que estava em um reunião importante e etc. É lógico que não
faço isso todo dia. Tento ser o mais presente possível, dou carinho, amor,
atenção e o principal: falo a verdade pra ele, sempre.
Com isso vivo uma
maternidade sem culpa e assim, sou uma mãe melhor.
O
que a Lu Brasil disse no texto, eu discordo um pouco: do papel que a culpa tem de nos
fazer melhor. Aliás, nos fazer melhorar ela até pode fazer, mas nos motivar e
viver dela é que não dá.
Segundo
o dicionário (da internet aí):
“Responsabilidade
de um ato ou uma omissão de um crime.
Causa de um mal.
Delito, falta.”
Causa de um mal.
Delito, falta.”
Essa culpa
ruim, estrutural e estruturante que falei no texto, é uma coisa. É aquilo da mulher
ser a melhor profissional, a melhor mãe que pode ser e ainda assim se sentir
culpada no fim do dia porque não fez tudo, não deu conta de tudo.
É o que mais
acontece.
A outra e
saudável culpa é aquela pontual. De você gritar excessivamente com seu filho
sem necessidade ou de não ter lido a historinha porque preferiu ver a novela.
Essa, eu sinto. De vez em quando e porque sou humana, erro. Sinto remorso. Peço
desculpas (sim, eu peço desculpas ao Miguel, porque mostro pra ele que mãe
também erra), tento reparar.
Essa culpa pode acontecer com mãe, pai, avó, tio,
e vizinho. Não é exclusiva da mulher, nem deve afetar sua autoestima e
maternidade.
Eu ainda vou
além disso. Sou tão segura quanto ao meu “eu mãe” que a outra culpa não me
consome, nem me atinge, mesmo quando vem de fora. E parando pra pensar, cheguei
à conclusão de que sou culpada mesmo. A “culpa boa”.
Vejam bem,
outro dia vi a Lívia falando no facebook:
“As pessoas
dizem que DOU sorte de ter filhos bonzinhos, Não dou sorte, dou EDUCAÇÃO”.
É isso,
me senti contemplada. Ouço o dia todo que Miguel é uma criança muito
inteligente, muito comunicativa, educada, amável, carinhosa, etc, etc e que
tenho sorte. Em contrapartida, se ele tem uma febre a culpa é minha. Uma lógica
que não entra na minha cabeça.
Quem tá com
ele todo dia? Que veste uniforme (alias, o ensinou a se vestir sozinho)? Que
prepara café da manhã? Que leva pra escola de ônibus (ensinando que nosso carro
foi roubado, mas que não tem problema, ônibus é legal também)? Que ensina a
passar na faixa de pedestre, dando sinal com a mão? Que ensina que não pode
jogar lixo na rua? Que tem que respeitar os mais velhos? Que tem que falar com
licença, obrigado, por favor e bom dia? Que ensina a agradecer à Deus pelas
coisas? Que ensinar a guardar os brinquedos? Que não precisa bater pra
ensinar? Que quando bateu pediu desculpas e ensinou que violência não educa? Que nunca deixou chorando? Que ensina que pra birra não resolve nada?
Que dorme junto? Que abraça, beija e dá muito carinho? Que amamentou por dois
anos? Que trata ele com respeito? Que ensina a respeitar os mais velhos? Quem
dá banho e ensina que não pode desperdiçar água? Quem lê história e
contextualiza? Quem incentiva a ler? Quem tá lá todo dia, faça chuva ou faça
sol, doente ou saudável, de carro ou a pé pra buscar na escola e viver tudo
isso, diariamente?
EU, EU, EU.
Então, minha
gente, sem desmerecer Deus que meu deu um filho MEGA especial, eu assumo: SOU
CULPADA.
Meu filho é
doce, inteligente, formula frases inteligentes, é elogiado na escola,
compartilha brinquedos, respeita os mais velhos, tem uma sensibilidade e
inteligência acima da média, sabe sobre leis de trânsito e direitos humanos,
canta, dança, é feliz e amável por pura CULPA MINHA.
É isso. Sou
culpada mesmo. Agora sim.
Observação: não quis
nesse post desconsiderar a importância do pai da criança, dos avós e tios, além
da escola, que são de fundamental importância do desenvolvimento. É só um desabafo com um pouco de auto-marketing.
Musa! poderia receber o titulo de representante das mães de verdade... que não vive no mundo com de rosa.... podemos e somos felizes com nossos pequenos mas o mundo continua girando.
ResponderExcluirluciana
Ei Marília.. esse texto diz muito para mim... Não consigo me livrar da culpa.. da "necessidade" de dar conta de tudo e da culpa de ver que não dou conta nem da metade.
ResponderExcluirTento muito a guarda compartilhada... pq mesmo sendo casada, o que mais existe é a "guarda" só da mãe, a responsabilidade só da mãe, a mãe que é a O cara, que sabe que faz... e bla, bla, bla.... Mas eu brigo muito pelas responsabilidade dividida... e acho que essa briga vai longe!!!
Seu texto me diz muito, eu poderia ter escrito (se escrevesse tão bem quanto vc) pq luto muito pela educação de Laís, para ela ser uma criança "boazinha por sorte".. e tbm ouço muito o "tadinha" por ela estar na creche o dia todo. mas ainda não consegui me livrar da culpa... é um processo!!!
Parabéns pelo texto... e pelo filho bonzinho que Deus lhe deu!!! hehehe
Bj grande!
Aah! Que eu amei seu texto!!
ResponderExcluirÉ bem isso... a culpa boa. Nossos filhos são o espelho do que passamos pra eles. Nada mais que isso! Se ensinamos e passamos coisas boas, vamos levar essa culpa boa com o peito cheio de orgulho!!! ♥
Lila, amo a forma como você se expressa!!
ResponderExcluirParabéns!
Bjos